Friday, August 9, 2013

...do abdicar e do tempo.

Há muito tempo a sociedade conhece a história de agir em prol de um medo qualquer por uma certeza futura, e no final de tudo, de todo esforço e toda luta contra este medo, o futuro já aguardado se confirmar em certeza. O mito de Cronos deixa bastante exposta esta realidade.Cronos (mito grego, o romano virou Saturno) um titã que temia ser destronado e por isso devorava os filhos. Pelo medo de perder o suposto poder fez uma das coisas que, para sua esposa Reia e vários outros titãs/deuses, claramente representava uma atrocidade. Mas, como seu medo era maior, manteve-se na crença de que se agisse em prol dele, controlando ao máximo as variáveis que julgava ser possíveis de controle em relação a isto, acaba por ser enganado por Reia e Zeus, seu filho mais novo é salvo e trocado por uma pedra. Ao ponto que Zeus, ao crescer, se junta e destrona o pai. Nisto, percebemos com clareza que todo o medo e toda energia gasta por Cronos para permanecer com o seu poder foi exatamente o que fez com que este fosse destronado.


Afinal, se tivesse agido de forma racional e emotivamente coerente, teria trabalhado o medo e não agido de forma passional a ele. Relacionando-se com o presente, o mito ganha uma força adicional de, inclusive, percebermos que várias das histórias que se passam ao nosso redor são construídas com a mesma base. Veja, por exemplo, o episódio III de Star Wars e você verá que o nascimento do Darth Vader se faz com a clara percepção futura do medo de fazer a princesa sofrer e morrer. Quando Anakin age com toda sua força para evitar a visão que teve, é automaticamente transportado para ela. Assim, de tanto evitar, acabou causando.


Trazendo o milenar mito para a nossa vida contemporânea, vemos o quanto nada aprendemos mesmo com vários possíveis dicionários sobre alguns percursos da vida. Vejo diariamente, tanto em mim quanto em amigos, o quanto nos esforçamos em prol de um medo, acreditando que se ele for o centro da nossa atenção, não deixaremos que ele nos atinja, mas no final, estamos nos movendo em direção à ele. Tornamo-nos rápidos especialistas, alteramos nosso estado de ser e muito é movido contra e não a nosso favor, com isso, temos várias situações criadas a partir de nossos medos, tornando-nos nossos maiores monstros e com isso sofremos as consequências de sermos, mundo à fora, exatamente estes monstros, em sua forma crescida e alimentada e confusa. Muito do sentimento do medo acaba associado à própria identidade e esta pode estar sendo colocada em risco, na cabeça da pessoa. Nisto o abdicar entra como uma ferramenta de emergência sobre a situação da própria identidade e da situação. 

Da identidade, porque quando percebemos de fato o que somos e que no fundo estamos inseguros, nesse estado acabamos por realizar uma dor sobre nós mesmos e para dar a segurança de volta ao processo é necessário estar apto a perder. Esta perda, tem que ser de forma consciente, de forma a que você abdique por amor a si, assumindo que não precisa carregar o fardo da questão.


Da situação, porque muitas situações geradas pelo medo, são situações que levam as pessoas uma obsessão clara de que nada, pode sair do seu controle e qualquer coisa que aconteça, será ruim. Nisso desprende-se de muita para tender manter o tal "controle" em ordem e funcionamento. Por isso, pessoas que escolhem deixar as situações acontecerem e quando de fato são colocadas em conflito, seja por uma pergunta direta, seja por uma relação de entendimento trocado ou qualquer coisa que o valha, conseguem ter mais lógica de raciocínio, ao invés de simplesmente reagirem à algo detendo assim a capacidade de recriar ou criar de fato, a própria história. 


Criemos a possibilidade de refazermos nossos mitos. Imagine se Cronos tivesse a possibilidade de refazer. Provavelmente, teria sido um pai amoroso e dedicado poderia mostrar a relação de algumas questões de forma sincera aos filhos, mostrando que não é errado sentir medo, frustrar-se e qualquer além, poderia escolher abdicar o trono e passar a vez a quem julgasse ser mais íntegro dos que gerou. Afinal, combater medo com compreensão mostra o quão nosso coração ainda se mantém capaz de ser e mostra o quão ainda conseguimos acolher (a nós e aos outros) e esse acolhimento é o abdicar do controle do medo. E nada melhor para sairmos do nosso caminho de medo com um pouco de amor e acolhimento. Ninguém nunca será fraco por reconhecer e ter um medo (até porque todos nós temos), mas torna-se mais forte aquele que procura não viver por ele e mais ainda aquele que sabe a hora de abdicar para não chegar ao ponto final.

Como disse uma amiga: "Desapego do soltar, entregar, deixar ir, deixar partir, fluir, viver no presente, sem o peso do passado, sem expectativas para o futuro, saber de nossa finitude, saber que somos passageiros, sem posses, sem medos, sem culpa."


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