Thursday, December 13, 2012

Da raiva à raiva

Num passado próximo, vi um homem, no trânsito, que gritava com tanta raiva que me fez pensar: qual seria o verdadeiro propósito desse sentimento?

Há dias tenho conversado com amigos sobre a questão da raiva, esse monstro que a todos nos persegue, que nos faz agir impulsivamente. Se colocarmos clareza em nossas mentes, veremos que ela geralmente não produz resultados positivos. Aliás, não só não os produz, como tem o poder de vir contra nós na mesma intensidade.

E aí vale novamente a pergunta: Raiva serve de quê? Raiva não teria nenhum bom sentido de ser?
Perceba, há um lado da raiva que não é totalmente ruim. Se considerarmos a raiva como um impulso que nos move contra o espaço cômodo e apático que nos colocamos, encontramos seu limite saudável. Por exemplo, por raiva de me sentir sempre sem energia, resolvi reorganizar minha vida em algumas linhas de rotina (exercícios, alimentação e coisas similares) para de fato conseguir readequar as coisas e não me perder nesses processos. Logo, pela raiva, houve movimentação e mais fácil adequação para o cenário daquele momento.

E quando a raiva nos faz perder a cabeça?
O fato é que, se a comparamos a uma substância qualquer, saberemos que em excesso ela certamente será prejudicial. Em pequena quantidade, ela provoca movimentação, mudança; em grande, torna-se um poderoso veneno que nos faz perder o controle das coisas ao invés de resolvê-las.

Essa raiva que possui implicações negativas origina-se da nossa incapacidade de manter tudo a nossa volta sob um restrito controle, segundo nossas vontades, desejos e dores (gerando assim um processo de emergência). Só que, no fundo, damos extremo valor a isso tudo, e geralmente essas vontades e dores são menores do que acabamos projetando.
Sobre isso, me lembro de um episódio peculiar.

Outro dia, minha mãe reclamou de falta de dinheiro e de como o descontrole financeiro era um problema que vinha de família: o seu pai teve muitas dívidas, assim como o pai do seu pai. Só que, em sua visão, ela era uma boa administradora e não compreendia como estava a ponto de ter dívidas.

Sua fala vinha, com muita raiva, das origens. Era como se o descontrole financeiro fosse um destino certo, um buraco de onde não pudesse sair por conta de uma corrente que lhe segurava o tornozelo e claramente a todos os que vieram antes dela. Naquele momento conturbado e por conta da empatia que sentia, comecei a ficar tomado pela mesma emoção. Resolvi sair por alguns instantes do ambiente em que ela falava, respirei calmamente e pude observar que, se entrasse naquilo, me colocaria tão vítima quanto ela da situação, e não havia menor necessidade.

Então lhe disse: "De tudo isso que você fala, eu só enxergo que você não reconhece o que construiu". Após alguns segundos, como se ela estivesse assimilando o que acabara de ouvir ela responde. "E o que você enxerga?" "Vejo uma mulher extremamente forte e rica, que ainda não percebeu de fato que construiu um império, especialmente comparado aos próprios pais e que está simplesmente passando por uma fase ruim, mas que logo entrará em equilíbrio". Depois disso, deixamos de nos falar por um tempo e, na manhã seguinte, ela me disse: "Ainda bem que você me falou aquilo ontem. Acho que faltava realmente ver que eu tava colocando mais areia num saco que já estava furado."

Claramente, todos nós temos uma tendência a termos uma atitude imediatista quando estamos com raiva, seja gritar, ficar melancólico, isolar-se (a minha, por exemplo), entre tantas outras. Utilizamos a raiva para reação, não para resolução. Ou seja, perdemos a capacidade de tornar essa energia algo produtivo e ainda podemos criar uma série de riscos e problemas que no fundo poderiam nem existir, não fosse o impulso destrutivo.

Sei que não há uma conclusão clara para a raiva, até por não ter uma direção concreta do que fazer necessariamente com ela, mas sinto que a velha premissa de darmos um segundo para ver se entendemos direito, para olharmos a situação com a imparcialidade que for possível, em vez de agirmos por impulso, ajude mais. Afinal, a raiva é como um bom medicamento se usado na dose certa (e aqui acho que cabe a cada um de nós perceber de fato qual a dose necessária), senão torna-se um poderoso veneno. E acho que ninguém gostaria de beber veneno.

2 comments:

Marte said...

São coisas que me dão raiva: injustiça, intolerância, violência e biscates.
Acho que é uma raiva saudável então, não? Haushushus
Ficou muito bom seu texto. Adorei.

May(a) said...

Esse ano, por um "acaso", acabei levando pra casa o livro Inteligência emocional do Golleman e um dos termos que muito me chamou a atenção foi "sequestro emocional". E é bem isso que a raiva faz, nos sequestra do raciocínio lúcido ou equilibrado ou simplesmente nos impede de raciocinar, somos tomados pela emoção e por ela e com ela respondemos. E o ruim é que a raiva é ruminante ou nos transforma em um ruminante, mastigando por muito tempo o mesmo material e só aumentando o desgaste.
Acho questão realmente é se redominar, muitos dizem que o melhor é cortar essa cadeia de pensamentos.. se distraindo para, então, pensarmos com clareza. Mas como vc disse, cada um tem o seu mecanismo. E tem tanta coisa envolvida num ataque de ira. Lembro que ele disse do mecanismo cerebral ser muito parecido com a resposta ao perigo. E o caso se encaixa, meio que sua mãe se sentiu em perigo de seguir um caminho que ela nao quer seguir... enfim, nem sei na verdade!

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